3.12.12

Blesne blekne blåner fjell inn i en gråvendt natt jeg reiser over bleknede blåners fjell og her i mørket er jeg forlatt.


[Soneto feito em 2006 (mais ou menos), inspirado no filme Espantalho (1973), de Jerry Schatzberg, com Gene Hackman e Al Pacino, e refeito semana passada.]


Na chuva não se veem as suas lágrimas
E enquanto o deus-tempo vira as páginas
Os corvos vêm zombar no dia findo
Sim, os malditos corvos estão rindo!

Seu sangue que cai é palha de estofo
Quando lhe pesa a roupa em tempestade
Misturam-se as tintas em seu rosto
E a água esconde a piedade.

E ele nem protege os canteiros
Só diverte os corvos galhofeiros
– É feito o Cristo só, sem redenção.

Pensam com pena: é mesmo um coitado!
Palhaço triste, já crucificado,
Nem pode esperar ressurreição!

9.11.12

Já uma dor vaga flutuava no fundo dos seus olhos: a dor seca das insônias.


Às vezes tens vontade de escrever?
Uma novela, um conto, alguns versos,
Ou um ensaio sobre qualquer tema,
Como se pensamentos tão dispersos
Tornassem interessante o teu problema,
E alguém se interessasse em te ler?

As ideias parecem bem melhores
Na mente do que postas no papel,
Quando elas parecem enferrujar
No contato com cada velho olhar,
Que faz o julgamento tão cruel.
– E lá se vai a arte aos estertores.

Saiba que os escárnios chegam lentos,
E externar sentimentos será sempre
Garantia de alguma frustração;
Melhor já abortar logo no ventre
O esboço de poema ou de canção,
Para se proteger dos julgamentos.

Percebe as palavras de desdém:
Um elogio será sempre mentira
E o silêncio, uma zombaria.
Eis o melhor conselho que eu daria:
Evita que essa dor ‘inda te fira,
Jamais escreve versos a ninguém.

23.10.12

Victory after all, I suppose! Well... but sad or merry, I must leave it now.


 “Então a porta se abriu
E alguém me pediu
Pra ficar calmo.
Ficar calmo?
‘Quem é louco aqui?’,
Falei pra distrair
E ninguém quis sorrir.
‘Fica calmo.’
‘Eu sou calmo!’”

(Violins, O Manicômio)


“Quer a verdade?” Acho que não;
Não quero mais essa sensação
De que a vida não vale a pena,
Assistindo sempre à mesma cena;
Dizer num ato meio impensado
“Ah!, eu me sinto muito cansado”
Só pra manter essa aparência.
– Eu sinto a minha própria ausência.

Uma pequena repetição:
O azar fica à própria sorte.
Estou cansado desse cansaço;
A vida fica meio em suspenso
E resoluto ante o fracasso,
Só resta agora esse imenso
Resto de vida à própria sorte.
– Na terceira ou quarta desilusão.

2.10.12

Eyes burn like an October sunrise.


A vida: este intervalo de mim mesmo
Vai acabando de acabar o tempo todo
Porém sem nunca terminar de acabar
Neste afã de inventar a própria morte
A releitura desse jogo de você
Moto-perpétuo da vontade de existir
Eu nem pareço acreditar no que escrevi
Pois nada disso me parece especial.
E ninguém mais pode dizer a tua dor.

28.8.12

To see the unseen glitter of life and feel the dirt, grief, anger and strife.


Agora presta atenção:
Um tanto assim de coisa alguma,
E qualquer forma imperfeita
De quase nada acontecer.
Nem lembras mais o que sonhaste,
Mas resta o medo de voltar.
(Choraste tantas madrugadas,)
(E maldisseste aquele amor.)
Pois onde estão os teus desejos?
E qual é mesmo o teu lugar?
Vês que não resta nada mais,
Apenas buscas qualquer paz.
Pois não querias exigir
Esse lugar que nem é teu,
E ser alguém que não és mais,
Ter a importância que não tens.
“Esperar tanto das pessoas
E querer tão pouco de mim.”
Sim, teu lamento é de justiça
Mas é assim que as coisas são.
O que nos resta deste jogo
É o momento tão solene
De nosso último pedido:
– Agradecer o breve fim.

13.7.12

I have deserved all tongues to speak their bitterness over me.


Tudo desanda numa marcha inexorável.
– Qual é o cardápio das tristezas do agora?
Por caminhar tanto assim à margem da vida,
Nem percebi que era hora da partida,
Não entendi que o destino era ir embora
E minha vida se tornara dispensável.
Pois estes versos hoje servem de prenúncio
Do que em breve restará aqui de mim,
Num desapego tão sutil que até espanta
Você ainda insistir que adianta
Não aceitar que tudo isso tem seu fim.
É o meu jeito de abraçar esse silêncio,
De balançar um pouco a cauda para os deuses
E demonstrar alguma fútil gratidão
Ao deus dos deuses do horror e da ventura,
Que se diverte com a nossa amargura
De desejar vingança em qualquer oração
E nos derrama seus acasos e revezes.
Então mergulho na estrada – e até mais ver!,
Pois é assim que essas coisas são aceitas
(Percebo agora que a vida virou pó)
É engraçado tudo isso, veja só:
Ser conhecido por viver de frases feitas
E no final nunca saber o que dizer.

17.6.12

Pois meu coração é assim: navegante à deriva, naufragado em mim.

Passou tanto tempo e o destino se mostra promessa desfeita estrada sem ninguém para lugar nenhum sei que despertarei na manhã carregada cinza baça e chuvosa tumultuada e infeliz quase ébria e febril de horror e afeição a viver mais um dia a engolir as mentiras cuspir as verdades cortar esse laço negar falso abraço perder coisa alguma na grandeza imensa vã angústia tristeza corpo exposto à mesa sem limite ou pudor para o fim e o início se reencontrarem nos versos antigos pois desejo que hoje termine e amanhã nem comece que o tempo acabe no sutil silêncio dos teus lábios secos meus olhos vazios no lado avesso do mesmo papel fale agora comigo não tente entender não me explique e enquanto isso me calo insisto e é difícil existir e ainda estar aqui por aí por você.

26.5.12

Like your heartbeat when you realize you're dying, but you're trying.

Um pouco mais de humilhação:
E quanta mágoa no olhar
Mal disfarçada todo dia
Por conviver com essa malta
Que se compraz na indecência.

Um pouco mais de lentidão:
Vidas trafegam devagar
Na contramão de qualquer via;
Tudo que sobra é o que falta
E sempre esgota a paciência.

Um pouco mais de indecisão:
Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar;
E quando chega o fim do dia
A esperança faz-se incauta
Para render-se à existência.

25.4.12

É como escolher, de tudo que foi feito e desfeito, vivido e sentido, o que ainda faz sentido e o que não me serve mais.

Não durmo. A chuva, fria, cai inclemente, sem paciência, com a serenidade de um executor. Vertigem. Vertigem. Vertigem. Qual é teu maior sonho? Ter novamente um sonho? No início havia a química. E as noites eram de estranha paz. Depois o tempo se recusa a passar. Nada a esperar. Encosto no sol e ele me queima as mãos feito esperança morta. E a náusea persiste, é um existir-demais para mim. Mais um dia longo, que já começou e não terá mais fim. As cartas não chegarão mais aos seus destinos, os corpos não serão mais enterrados, não haverá mais choro ou riso. Apenas a metafísica inútil dos conselhos sem valor. Ainda existo. E é grosseiro, rude, apressado. As palavras que nem chegam a existir de verdade. É preciso imaginar Sísifo, etc.

16.3.12

Se os gestos e as palavras que sonhei, nunca os usei nem usarei, se nada do que levo a efeito vale, que eu me não mova, que eu não fale!

Eu vim pensando desde a alta madrugada
“Por onde anda minha antiga inspiração?”
Amanheceu e fui pensando em tudo e nada
Chegando a esta malfadada conclusão.

A existência é um negócio irritante
Uma coisinha bem ridícula e pequena
Cheia de planos que não vão mais adiante
E velhos sonhos que não valem mais a pena.

“Antigamente era mais fácil e até fraterno!”
“E não havia elegias ao cinismo”
Mas talvez isso seja apenas passadismo
E tenha sido sempre esse mesmo inferno.

Eu sei que estou um tanto amargo nestes versos
– São as memórias do que sei e o que já tive
Em outros tempos o lirismo era mais livre
E os pensamentos não fugiam tão dispersos.

9.2.12

Like the way you cry for a happy ending.

Placidamente me encontro no escuro
A contemplar este silêncio em devoção
Que à minha volta construiu um grande muro
E que não fora em verdade solução.

Só o desejo improfícuo de dormir
De quem atento inda tropeça nesses astros
A esperar pela ventura do porvir
Por mais um dia que será igual aos outros.

E a palavra que traz todas as respostas
A carregar todo esse peso em minhas costas
De tudo aquilo não há e há em mim
Vem repousar numa palavra só: enfim.

26.1.12

E era como se a água desejasse escapar de sua casa que é o rio e deslizando apenas nem tocar a margem.

Sempre a resposta errada
Da pergunta que ninguém fez
Uma placa ao largo da estrada
Que indica lugar nenhum
A longa espera pelo dia
Que não chegará jamais.

18.1.12

Cherish the certainly of now: it kills you a bit at a time.

Os paradoxos invadindo a alma
E a memória de uma vã procura
Que vai trazer a mais cruel loucura
A redenção da nossa própria calma

Reinvenção de uma excelsa morte
Glorificada no vazio da sorte
De quem já não conseguiria nada
Além de expor a convicção cansada

De uma régia e sutil presença
Tão decadente, assustadora e fria
Cambaleando em fugaz descrença
Na esperança que já não havia

Por uma glória já perdida e só
De um amor desencontrado em si
O puro escárnio de quem nunca ri
A renascença do horror sem dó.

13.1.12

O destino que tens, de querer o impossível, é igual a este meu, de querer ser feliz.

Mais um entardecer em que a sorte não vem
Fosse a esperança tão-só um remendo
Imagino que algo esteja acontecendo
E eu resolvo viver as venturas de outrem

Vasculho as histórias fossem todas minhas
Perco-me nas memórias de plebeu e rei
Que me revelam cada coisa que não sei
E me descrevem n’outras luminosas linhas

Relatos de viagens que jamais farei
E fotos de pessoas que não conheci
De tanto ouvir e ver, eu até me cansei
Da minha própria vida eu me esqueci

Volto à realidade da vida ordinária
Que me deixa com sono, cansado e só
Encosto-me na cama, apago a luminária
E meus sonhos se perdem, nas cinzas, no pó.

10.1.12

Renaissance is over and I wonder: should I close my eyes and pray? Feel like I've betrayed? Always be the same (once again)?

Houve um tempo em que as palavras vertiam do chão e desabavam de meus lábios e meus olhos e escapavam de minhas mãos caudalosamente sem cautela alguma apenas a expressão nada sutil do escândalo e eram todos os sonhos insones uma infinita e grosseira fome de conhecer de começar a reviver tudo que estava insepulto e vandalizado ó deus em quem não acredito como eram vivas as negras paisagens que eu derramava fossem flores de escárnio e tormento numa sagrada profanação da divindade suja que era eu mesmo no início sem final no bem que também era o mal e eu me tornava nunca deixara de ser o próprio deus culpado açoitado ressurreto a ascender ao mais excelso e régio círculo imperfeito do panteão das minhas visões sublimes infernais em comiseração a sursis de um deus que precisava ser temido e adorado só precisava ser aceito por todos por ninguém na celebração de tudo que era incerto quando não havia tanta paisagem útil a me distrair e meus olhos se voltavam somente a você à adoração cheia de desprezo desapego desespero a tudo que eu amava eu fingia eu temia por me faltar por eu não saber toda a lírica do ódio dedicada ao imenso vazio que era o interstício de existir momento de se calar de cantar todo aquele silêncio brutal que doía envolvia todos que um dia vieram ficaram pelo caminho que nem existia somente a ventura ressentida do agora só por hoje nunca houve atirado no chão corpo entregue ao mar absoluto que jamais vi ao qual pertenço desde que resolver não mais escrever existir desistir em reverência ao mais profundo e majestoso esquecimento.

9.1.12

Sem esclarecimento tudo será apenas crueldade.

Falta de excesso de assunto
Regresso de falta de tudo
De tempo que sobra e falta
– Excesso de pauta no mundo.

Porque depois de tanto tempo
Sem escrever coisa qualquer
Precisa ser definitivo
E infinito e imperativo
Sobre a existência ou uma mulher
Ou qualquer coisa que invento.

No entanto a idéia não vem
Só a velha insatisfação
Com todo escárnio e desdém
Que mata a inspiração.